Ouvindo uma exposição do Governo sobre o empreendimento de integração das bacias hidrográficas do Nordeste, de um lado, e lendo as objeções ao projeto, de outo lado, fica-me a nítida sensação da contraposição da auto-suficiência (para não dizer autoritarismo) e a falta de conhecimento (para não dizer ignorância).
Existe uma realiade: uma região brasileira no nordeste, com um regime pluviométrico extremamente irregular e com uma condição de solo desfavorável, que não retém a água, de tal forma que está sujeita a grandes indundações periódicas e a prolongados períodos de seca.
Ao mesmo tempo, existe um rio caudaloso nas proximidades.
Sempre existiu, diante desse quadro, o sonho de que o problema da seca do Nordeste se resolveria levando a água do Rio São Francisco, o velho Chico, para as áreas do semi-árido.
Se isso não foi feito antes, pode ser debitado à falta de recursos públicos, a restrições tecnológicas, conhecimento dos impactos ambientais e falta de vontade política.
Lula, como uma pessoa oriunda da região, que viveu pessoal essa realidade de seca e de fome, tem a vontade política de resolver definitivamente o problema da seca do Nordeste, e acredita que a solução está no velho sonho de distribuir - mais equitativamente - as águas do Velho Chico.
Colocada como prioridade de Governo, pode canalizar os recursos disponíveis . Um primeiro questionamento é se governo deveria priorizar os recursos para uma obra como essa ou para resolver - primeiramente - outros problemas que seriam mais urgentes, como na área da saúde, do combate à violência ou à geração de empregos. É uma discussão de natureza ideológica e política, que não vamos entrar aqui. Mesmo que não haja conhecimento suficiente, valem as posições ideológicas. Vamos partir do direito do Governo, com a devida aprovação legislativa e nos termos da lei, de priorizar a solução da seca do semiárido nordestino.
A segunda crítica é se a solução está numa obra grandiosa ou em milhares de cisternas. As ações são complementares e há um amplo programa em andamento. Um programa não elimina outro, embora tenha impactos diferenciados. Assumido como prioriadade governamental, haveria recursos suficientes para ambas as iniciativas. Ademais o programa de cisternas é um pequeno retorno dos elevados ganhos que os bancos tem com a política de altos juros. Há uma falta de conhecimento melhor sobre o alcance dos progrmas em andamento e sua progamação.
Os dois pontos adicionais de maior importância são a viabilidade técnica do empreendimento e os impactos ambientais. Mas o maior importante é a sua eficácia física, social e econômica.
A evolução do conhecimento tecnológico permite ter soluções avançadas de engenharia, embora sempre possam ser questionadas em relação ao seu custo e de alternativas - para a solução do mesmo problema ou da mesma pergunta (se esta está certa ou errada é outra questão). Muitas das critícas caem para respostas alternativas, mas a outras perguntas. O desenvolvimento do projeto mostra uma sustentação tecnológica da soluções.
Os impactos ambientais diretos estão avaliados e o seu gerenciamento aprovado. O mesmo pode ser dito a alguns indiretos (pois nem sempre se pode prever todos os indiretos). Mas os impactos induzidos, principalmente os de caráter sócio-econômico estão longe de um conhecimento e proposições consistentes. Esses, estão mais relacionados, com a questão da eficácia.
A eficácia física está na sustentação do suprimento hídrico. A grande dúvida é se, em numa estiagem prolongada, haverá água suficiente no Rio São Francisco e nos canais de distribuição. A segurança é demonstrada por estatísticas centenárias, o que não elimina os riscos.
Vencidas todas essas questões anteriores sobra a polêmica dos impacto econômico-sociais. Sem dúvida, a disponibilização da água do São Francisco no semi-árido poderá viabilizar grandes empreendimentos do agro-negócio. Além das frutas, melhorão as oportunidades para a produção de grãos e da pecuária. O gargalo poderá estar na logística.
A produção nas novas áreas poderá ser competitiva, mas poderá perdê-la, para chegar aos portos, por insuficiência de infra-estrutura.
Essa produção irá aumentar a renda regional, mas continuará excludente, mantendo milhares à margem da economia moderna. Poderá ter impactos piores. Substituirá milhares de pequenos produtores que irão engrossar o movimento dos sem terra, por poucos opradores de equipamentos, importados de outras regiões. Aumentarão as áreas urbanas, mantendo uma periferia de excluidos, sem terra ou sem-teto.
As soluções efetivas para a agricultura familiar isolada ainda não são suficientemente consistentes. Esse é ainda o grande ponto fraco do empreendimento, segundo uma perspectiva holística.